segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Ich bin ein bola de Berlim



Dizem os mais puristas da gramática alemã que o carismático presidente norte-americano John Fitzgerald Kennedy terá dito "Sou uma bola de Berlim!" em vez de "Sou um berlinense!" no seu famoso discurso em 1963, cerca de três meses antes de ser assassinado em Dallas no Texas. Quase 50 anos depois Marcelo Rebelo de Sousa, o político-comentador televisivo, revitaliza o célebre discurso num vídeo em estilo caseiro que supostamente deveria sensibilizar os alemães para o esforço brutal a que estão sujeitos os portugueses devido às medidas de austeridade e ao desdém da Alemanha para com uma nação esforçada com quase 40 anos de democracia.  


A famosa bola de Berlim em Portugal, sonho no Brasil e pączki na Polónia


Não aprecio discutir política, quem me conhece sabe-o bem, mas os pedidos de familiares e amigos no Facebook para partilhar o "vídeo proibido" de Marcelo Rebelo de Sousa requerem um momento de reflexão e uma explicação para o motivo pelo qual não me dão ganas de partilhar o dito "Ich bin ein Berliner" Made in Portugal.

Vi no Youtube a produção da NextPower que supostamente deveria ser mostrada na Alemanha, na Praça Sony em Berlim. Diz alguma da imprensa portuguesa que foi proibido ou seja, alvo de censura. Segundo os alemães o motivo para esta decisão prende-se com o carácter politizado da mensagem que, no seu entender, não é apenas uma demonstração do que é Portugal nem tampouco o de provar que não somos preguiçosos. O senhor embaixador da Alemanha em Portugal através da chefe da secção de imprensa e cultura da Embaixada da Alemanha, Annette Ludwig, reitera que a transmissão "não pode ter sido 'impedida' pela Embaixada", lembrando que "todos os órgãos oficiais alemães defendem a liberdade de opinião e de informação".


Então como entender este aparente atentado contra a liberdade de informação? Visualizei o vídeo de 4:45 minutos para formar uma opinião. Opinião esse que (devo assinalar) pela distância a que me encontro e pelo facto de não ir a Portugal há uns anos, é porventura diferente daqueles que estão a sofrer directa e indirectamente com os planos da Troika para Portugal.

Filmado em Lisboa, junto ao Padrão dos Descobrimentos, símbolo da nossa gloriosa História e do período áureo dos descobrimentos que por um lado nos tornou um império e alargou as nossas fronteiras para um tamanho incomparável àquele de Portugal continental por outro também foi destruidor de mundos, culturas milenares e sábias existentes nos territórios que viríamos a chamar de colónias - tudo em nome de Deus e da Coroa portanto absurdamente justificável e lógico no contexto histórico da época. 



O vídeo começa em 1974 com a revolução dos cravos que pôs fim a uma ditadura bafienta e sufocante que, por muito que sejam contra, usou a tortura e a opressão contra a oposição sendo o assassinato de Humberto Delgado e as perseguições aos membros das células do Partido Comunista Português, prova cabal disso.

Melhoramos as condições de vida dos portugueses, a alfabetização, a taxa de mortalidade infantil e a esperança de vida tudo sem recurso ao Plano Marshall. Aqui começa a primeira não-verdade do vídeo. Recebemos sim: entre 1950 e 1951 recebemos 70 milhões de dólares tanto como a Áustria e uma simples pesquisa na Internet não só prova isso como ainda nos brinda com interessantes cartazes de propaganda americana sobre a generosidade dos norte-americanos para com uma Europa destruída e desmoralizada.



Depois passamos ao mea culpa pelo modo como gastamos ou esbanjamos dinheiro onde vemos uma senhora na casa dos seus sessenta a mostrar um cartão de crédito enquanto ao lado esquerdo vemos um BMW série 5. Afinal 41,3% do parque automóvel português são viaturas Made in Germany. Pois... que culpa temos nós da qualidade dos VW, Audi, BMW, Porsche e Mercedes? E porque têm eles de agradecer o facto de muitos de nós lhes andarmos a comprar carros usados com mais de 200.000 km que depois aparecem à venda com 68.999?

As parcerias com Portugal... os alemães são uns mal-agradecidos... A Siemens passou-nos a perna depois de instalarmos uma rede de fornecimento de energia para veículos elétricos sem os ditos estarem construidos (com certeza que alguém beneficiou com a negociata) e ainda lhes andamos a comprar submarinos Trident ao custo de biliões de € mais as negociatas com a construção de estádios para o Euro 2004. E com isto tivemos de cortar com a despesa pública, no elo fraco, a classe-média - essa vaca leiteira que é ordenhada até cair prostrada. Do bebé ao idoso todos saíram prejudicados mas talvez pensem mal de nós e nos vejam como uma espécie de Brasil europeu onde a tristeza é esquecida com o Carnaval e com festas populares ou será que deveriam ter referido com futebol, telenovelas e a Casa dos Segredos? Melhor não -  a Casa dos Segredos passa na TVI e nesse canal televisivo o autor, o político-comentador Rebelo de Sousa, retira o seu cheque regularmente.

Portanto trabalhamos mais horas, vamos para pensionistas aos 67 e não temos tantos dias de férias e feriados como os alemães mas eles deveriam saber que somos trabalhadores árduos mas mal pagos. Deveriam saber que além disso pagamos muito mais impostos e quando protestamos nas ruas até abraçamos a polícia de intervenção. Chegamos à conclusão que os alemães controlam as regras do jogo na UE, que têm poder e são uma potência mundial., que podemos fazer senão baixar as orelhas e pedir aos alemães que "metam cunha", que se lembrem de nós, povo, e esqueçam a corja de bandidos que vilipendiaram Portugal e foram engordando desde a década de 70 até hoje?

Porque não um vídeo mais esclarecedor - aos alemães à Europa e ao mundo - da classe política eleita pelo povo (que confiou e depositou a sua esperança neles) sobre as negociatas, os absurdos da corrupção do Estado português e de muitos dos seus políticos, do despesismo estapafúrdico com tantos projectos megalómanos como o TGV, o novo aeroporto e novas auto-estradas. Perdemos noção dos escândalos envolvendo dinheiros públicos, dos casos de compadrio entre privados e o Estado. Do "fax de Macau" passando pelo BPN ao escândalo Freeport são centenas! E a culpa é de quem?

É por demais evidente que o problema é sobretudo político e a intenção do vídeo é porventura necessária no contexto de desmoralização e pessimismo em que se vive correntemente. Temos de levantar a cabeça! A Alemanha ganhou poder pela incompetência política de muitos dos seus parceiros da UE e não somos excepção. Antes de tudo há que desmontar Portugal começando pelo desmantelamento das máquinas partidárias e da bipolarização do governo em PS e PSD-CDS. Descentralizar para aliviar o Estado dos "tachos" das juntas de freguesia e da mentalidade do "emprego como funcionário público que é seguro e serve para toda a família". Investigar e prender os políticos que enriqueceram do dia para a noite, os altos funcionários públicos e gestores que usam e abusam do erário público, dos privilégios, investigar os deputados da Assembleia da República que vendem pareceres das leis que eles próprios criam, as ligações entre a banca e o Estado.


Se temos tudo aquilo que têm os alemães mais um país com uma gastronomia e paisagens fantásticas porque motivo eles chegaram onde chegaram e nós não? Quem está mal? Quem é realmente o verdadeiro culpado?



Memorandum passa a "Um outro blogue"

Porque não me sentia confortável com o título do blogue "Memoradum" - a lembrar politiquice em vez de recordações ou factos assinaláveis e dignos de memória - mudei-o para "Um outro blogue". 

Fica assim, a meu ver, mais em consonância com o Um português na Polónia e é de facto o meu outro blogue; afastado da Polónia e da minha experiência de vida com os polacos. O endereço não se altera ricardotaipa.blogspot.com/ - só mesmo o título. 

O meu agradecimento a todos os meus os leitores e um bem hajam!

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Cápsulas e coisas perdidas no tempo



Miss Belvedere


Em 1957 um Plymouth Belvedere 0 km a cheirar a novo foi fechado num sarcófago de betão para supostamente sair do mesmo modo no distante ano de 2007.



Há 50 anos atrás o belíssimo Belvedere branco e dourado foi enterrado numa campa de betão armado e embrulhado em papel especial no motor e na carroçaria. O objectivo seria transformá-lo numa cápsula do tempo para que as gerações vindouras soubessem como era a sociedade de Tulsa em 1957.
Junto com o veículo foram enterradas, uma grade de cerveja de uma fábrica local, mapas de Tulsa, um bidão de gasolina (diziam que em 2007 a mesma seria inexistente) fotografias várias, cartas de cidadãos e dos dirigentes locais e um microfilme que contém a resposta para o futuro proprietário do (velho) novo Plymouth Belvedere. O concurso dava como vencedor aquele que estiver mais próximo do número actual de habitantes de Tulsa, se não estiverem vivos em 2007, serão os herdeiros a levar para casa o Plymouth.










Assente em quatro preguiças e embrulhado para resistir a 50 anos debaixo da terra o outrora reluzente Plymouth estava completamente corroído e impossível de restaurar. O desapontamento dos organizadores era visível mas pelo menos o contentor com o microfilme e as mensagens estava impecável. 


O vencedor foi um homem que em 1957 passava por Tulsa e por acaso concorreu, deixando o seu palpite. O legitimo proprietário do carro morreu com cancro em 1979 e não teve filhos, a sua esposa morreu em 1988. O herdeiro trata-se de um sobrinho deste senhor que, de acordo com o tablóide Tulsa News, irá levar o Plymouth numa Road Trip (de reboque) até Nova Jérsia de modo a que seja desenferrujado por a firma Ultre One que vende um "milagroso" removedor de ferrugem:



O novo dono do Plymouth afirma que não será um restauro mas sim uma limpeza...


 O pombo-correio inglês 

David Martin um pensionista britânico decidiu que havia chegado a hora de fazer obras na lareira e chaminé da sua casa em Surrey. Ao começarem os trabalhos uma quantidade assinalável de sujidade e dejetos trouxeram consigo o esqueleto de um pombo-correio prontamente identificado pelo pequeno canudo numa das patas. Para surpresa do locatário o canudinho vermelho continha uma mensagem codificada ao estilo Código de Da Vinci e a informação que a ave havia nascido no ano de 1940, em plena II Grande Guerra.

Fonte: http://www.dailymail.co.uk/news/article-2226203/Skeleton-hero-World-War-II-carrier-pigeon-chimney-secret-coded-message-attached-leg.html?ito=feeds-newsxml

De acordo com os historiadores os pombo-correio foram de grande utilidade durante o conflito e terão sido lançados mais de 250.000 com mensagens secretas. A velocidade de 1 milha por minuto destas aves e o seu sentido de orientação permitiam que atravessassem as linhas do inimigo com informações cruciais para os militares e serviços secretos. Este herói alado terá sido lançado no Dia D e por motivos desconhecidos (cansaço, inalação de fumos tóxicos) pereceu na chaminé sendo encontrado 67 anos depois nesta nossa sociedade tecnologicamente avançada que quase instantaneamente divulgou na Internet a sua heroica tarefa e missão.

Dentro do canudo encontrava-se uma mensagem codificada - que está a fazer as delicias dos aficionados - de 27 códigos com uma combinação cinco números e letras enviada por "Sergeant W. Stott" para o destinatário XO2 que se supõe ser o Quartel General  de Bletchley Park em Buckinghamshire.

Por enquanto especula-se o teor da mensagem mas tudo aponta para que estivesse relacionado com o desembarque na Normandia. Esperemos que a tal sociedade tecnologicamente avançada deslinde o mistério de tempos em que ainda se escreviam cartas com tinta e papel e onde os telefones eram considerados um bem de luxo. 


O Pontiac Bonneville Safari perdido nas areias da Califórnia


Fonte: http://hooniverse.com/2012/06/11/hooniverse-modern-art-monday-a-1964-pontiac-bonneville-wagon-as-still-art/


Nos anos 60 o automóvel Made in USA tinha de ser cromado, enorme, largo, comprido e de preferência com um motor V8 acoplado a uma pachorrenta caixa automática. O Pontiac Bonneville tinha tudo isto mais uma área de carga que tornava as station wagon americanas autênticas cavernas motorizadas.

O carro em questão apareceu um dia destes numa praia californiana mais propriamente em Morro Bay Califórnia na praia de Sand Spit. Supõe-se que terá sido abandonado (perdido, roubado ou esquecido) no ano de 1973 - de acordo com Mike Baird o autor das fotos e descobridor do achado. 

Fonte: http://www.oldcarbrochures.com

Pouco ou quase nada se sabe sobre o automóvel. Especula-se que algures nos anos setenta o seu proprietário deixou-o na praia e nunca mais o viu. Sand Pit, pelo que apurei, é uma praia com características particulares onde as tempestades de areia e marés-vivas são frequentes. Eventualmente o patilhas boca-de-sino e camisola de gola alta que o conduzia ou estava cansado das avarias ou fumou uns canhões com uns amigos numa noite qualquer para no dia seguinte encontrar apenas o mar, areia e gaivotas.

Quase quarenta anos depois sobrevivem na carcaça corroída os para-choques cromados e algumas partes do interior em vinil, esse tecido tão típico dos anos 70.  O autor confirma que o Pontiac desapareceu dias depois engolido novamente pelas areias californianas. Será que só o iremos ver de novo em 2050? 




Meretricum antiquitatis*

Eventualmente um dos antepassados de Rocco Siffredi em jogos sexuais em Pompeia

A história de Pompeia é conhecida por muitos. Corria o ano de 79 d.c. quando o vulcão Vesúvio entrou em erupção enterrando em lava, cinzas e pedras a então populosa cidade de Pompeia. Só no século XVIII se procederam a escavações arqueológicas que revelaram em grande detalhe a vida dos seus habitantes e os seus últimos momentos – conservados em cinzas e muitos apanhados pela nuvem piroclastica semelhante, em parte, a uma explosão nuclear. Afastado do centro da urbe uma descoberta insólita, um lupanario vulgo bordel ou mais comumente uma casa de putas. 

O edifício perfeitamente conservado revela frescos eróticos e é constituido por dois pisos. De acordo com os historiadores o rés-do-chao seria para os clientes menos abastados e o piso superior para os que tinham mais Sestércios – não se sabe contudo se a qualidade das meretrizes era correspondente ao piso ou não mas supõe-se que sim. Aparte dos frescos os graffiti (inscrições nas paredes) são reveladores do tipo de frequentador de tais instalações; Hic ego puellas multas futui (Aqui **** muitas moças) ou Felix bene futuis (Sortudo, **** bem) entre outros. Eventualmente teriam sido escritos enquanto esperavam pela sua vez. 

O bordel com quase 2000 anos no cruzamento da Via dell’Abbondanza

Numa investigação feita por arqueólogos não se encontraram vestígios de portas ou mobiliário supondo-se que se houvesse algo para esconder as poucas vergonhas só mesmo cortinas que teriam sido destruídas pela erupção e pelo tempo e um colchão serviria de leito para as fornicações.

Não foram encontrados restos humanos no lupanário de Pompeia.

* Velha prostituta

Fonte: Wikipédia

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Porque não consigo esquecer o meu Fiat 128 Sport?

Fiat 128 Sport Coupe 1300. 1973-2005. Rust in Pieces...

Esteve na família durante 32 anos e foi esse período de tempo que durou. Três décadas de automóvel e de memórias que contam histórias e períodos históricos de Portugal e das nossas ex-colónias. Nasceu em 1973, em Turim, na gigantesca fábrica da Fiat, vinha pintado em vermelho vivo numa cor chamada de rosso arancio e o interior era em vinil preto com elementos cromados tão típicos dos anos setenta. Teve matricula italiana, angolana e finalmente portuguesa. O BP-39-93 acabou os seus dias em 2005, numa prensa hidráulica, esmagado até ficar irreconhecível. Ainda não consegui comprar outro e falta-me a garagem mas enquanto isso não acontece visita-me em sonhos, o meu 128 Sport Coupe e outros iguais, em outras cores.

Parte dele - das peças dele - "vive" noutro modelo igual restaurado ao mais ínfimo pormenor, está em Portugal, na cidade de Alcobaça. Os Bento tomaram conta de parte do Fiat 128 dos Taipa e não poderia estar em melhores mãos. Pena que não tenham chegado a tempo de ficar com tudo.

O Fiat substituiu um Austin Mini 1000 que foi moda nos anos sessenta mas depressa mostrou os seus limites por ser demasiado baixo, duro e acanhado para longas viagens. O 128 foi levantado no porto de Lisboa e estava ao sol escaldante há meses, os bancos ligeiramente esfarrapados pelo sol foram prontamente estofados e as garantias da época eram mínimas. Os construtores davam pouco espaço para reclamações e os concessionários eram simpáticos e prestáveis até receberem o cheque do cliente. A cor pedida era em branco mas na hora de levantar só haviam 128 vermelhos e o meu pai lá aceitou em troca de ter de esperar mais uns meses por um na cor desejada. 

Foi de barco para Angola e em Luanda recebeu uma matrícula AAB que pouco foi usada. Entretanto nasceu em Dezembro o vosso escriba e usufruiu um Fiat novinho em folha que só iria conduzir dali por 20 anos! No ano seguinte a ditadura acabou em Abril e todos sabiam que as colónias iam ser entregues. O Portugal ultramarino, o império português estava a chegar ao fim. 

O Fiat regressou de barco a Portugal e em 1976 recebeu uma matricula de "retornado", BP-39-93. Viveu mais cinco anos no Estoril e a salitre tomou conta do aço já de si fraco nos carros italianos desse período. Os russos são hoje em dia dados como culpados pela desgraça dos Fiat ferrugentos, dos "Alfa Seltzer" (Alfa Romeo que se desfaziam em contacto com água), os Lancia e os Ferrari que também ficavam corroídos em cinco ou seis anos, nem o Fiat 147 brasileiro se livrou da ferrugem. O aço barato e poroso vindo da Rússia havia sido uma negócio da China entre os italianos e a URSS em troca de tecnologia - os Lada eram praticamente iguais aos Fiat 124 e 125 italianos. Os russos ganharam o Lada e os italianos reputação de fabricarem carros ferrugentos.

Em 1979 transportou a família do Sul, do Estoril, para o Norte, para uma pequena vila (ainda era vila) chamada de Vila Nova de Famalicão, ali entre o Porto e Braga. A humidade e a pluviosidade do Minho não ajudaram o aço russo e no inicio dos anos oitenta foi totalmente pintado por um bate-chapas que errou a profissão e deveria ter sido sapateiro. Os pormenores cromados na grelha, as riscas desportivas na mala e as embaladeiras em preto mate foram passadas a vermelho. Estávamos na década de oitenta e o carro que até então era um dos melhores da rua começava a ficar ultrapassado, a ficar velho. O meu pai não o trocou e as ruas passavam a estar apinhadas de Fiat Uno, Renault 5 GTL, Opel Corsa, Citroen Visa e outros carros mais modernos com para-choques em plástico.   

Anos setenta no seu melhor. Patilhas, calças boca-de-sino, óculos em massa, camisolas em gola alta justas ao corpo e estofos em vinil preto em carroçaria verde-sopa. Perfeito!

A dada altura passei a ter uma relação amor-ódio com o Fiat. Ora me imaginava a conduzi-lo ora a atirá-lo de um barranco, ora a lavá-lo ora partir-lhe os vidros e os faróis com uma marreta, a atirar-lhe um farrapo com gasolina e vê-lo a arder, dar-lhe uns tiros de pistola... 
Na escola secundária chamavam-lhe "a relíquia" e foi parte do pagamento do salário dos mecânicos da oficina Adão & Mesquita durante 19 anos. Eram tempos difíceis e não haviam créditos ao consumo como hoje em dia. O vizinho de cima trocou o 127 por um VW Golf, o barbeiro um Autobianchi A111 por um Citroen Visa, o do lado um Ford "ora bolas" também por um Visa e os meus tios e vizinhos o Dyane Nazaré por um Renault 19 novinho em folha. Todos trocavam de carro menos nós. O meu pai estava satisfeito com o Fiat para as voltinhas na cidade (tornou-se cidade entretanto) e os anos passaram sem nos apercebermos.

Outra década chegou, os anos 90. Tempos de saídas à noite em carros modernos com os amigos "betinhos" (há quem diga que se são de Famalicão não podem ser betinhos) e nas "bombas" da década. Os caixões com rodas como o Fiat Uno Turbo i.e, o VW Polo G-40, o Citroen AX GT... Foi nessa altura que algum alivio chegou. Os meus amigos mais próximos, os "cabeleiras" e o Pedro também tinham charutos se bem que com uma estrela no capot. Dois Mercedes 240D e um Citroen CX 2500D eram dos anos setenta como o meu Fiat! Certa vez tentamos cronometrar a aceleração 0-100 km/h do Mercedes 240 Diesel. Desistimos ao fim de 20 segundos... 


Em 1994 após um calvário com instrutores e examinadores corruptos lá consegui a carta de condução. Finalmente fui devagarinho para a escola secundária ao volante do 128 do pai. Cada dia que passava ia acelerando um pouco mais, ganhando coragem e confiança. Uma noite, no regresso das aulas, decidi puxar o travão de mão na areia que ficava ao redor de uma rotunda lá ao pé de casa. Fiquei virado ao sentido contrário de onde vinha, voltei a repetir a façanha... O Fiat 128 Sport era afinal um carro desportivo feito para acelerar e fazer piões! Nesse dia abri a caixa de Pandora. Fui com ele para Espanha, enterrei-o na areia da praia pelo menos duas vezes, tive sexo dentro do 128 (tirava os bancos das calhas e deixava-os de fora para ter espaço!), bati num Datsun 1200 e numa Vespa, encostei o ponteiro nos 180 km/h na auto-estrada Porto-Famalicão, perdi-me no Marão e nas serras de Celorico de Bastos tendo de fazer corta-mato e finalmente convenci o meu pai a pintar o dito num derradeiro pseudo-restauro que durou um ano.


 Em 1997 foi finalmente para a reforma para dar lugar a um anónimo, aborrecido, silencioso e confortável Renault Clio RT com bancos em veludo, vidros elétricos e chave com comando, um luxo a comparar com o equipamento espartano do 128 de duas décadas atrás. Recordo-me como se fosse hoje do último dia em que o conduzi na estrada nacional numa tarde de Verão. Ouvia o roncar do motor e do carburador duplo Weber e dizia à minha namorada de então - Um dia vou sentir falta de ouvir o som deste motor. 

Atirado para as traseiras do prédio, coberto com um encerado de camião depressa se degradou. Desmontei-o no interior e nalgumas partes mais fáceis de retirar e guardei tudo na cave do prédio. Um dia uns gatunos refugiram-se dentro dele depois de terem assaltado um café e no dia seguinte o cheiro era nauseabundo, não lhe toquei mais. Entretanto fui para a Polónia fazer Erasmus, por lá apaixonei-me e dois anos depois emigrei. O Fiat ali ficou esquecido e esburacado até que decidimos dá-lo aos mecânicos que tão boas recordações tinham dele. Em 2005 pesquisava na Internet sobre o modelo 128 e encontrei num fórum um João de Alcobaça que, junto com o pai, restauravam um igual ao pormenor. Dei-lhes tudo o que tinha na cave e desde então que estou em contacto com eles. Ainda não vi ao vivo o 128 deles mas está combinada uma visita quando for a Portugal. 


 Perseguição policial em Varsóvia dos anos setenta entre um Fiat 128 Sport L e o Fiat 125P da "Milicja" (polícia) comunista. A série policial trata-se do O7 Zgłos Się (O7 responda).

De vez em quando conduzo-o. Tudo em sonhos mas como se fosse real. O toque do volante, a sensação de aceleração e mesmo o cheiro. O nosso cérebro não distingue os sonhos da realidade e assim vou matando saudades. Curiosamente o 128 Sport Coupe também foi vendido na Polónia comunista e já vi um em Łódź; quase que batia ao vê-lo mas ao menos ficou-me a esperança que a próxima matricula do meu 128 seja polaca...


domingo, 30 de setembro de 2012

O Grunho Corporativo - por João Ferro*

Capa do álbum Animals dos Pink Floyd


Olá amigos, antes de mais convém explicar que palavra e esta ‘’Grunho’’.

Na Infopedia on-line esta definida da seguinte forma:

- grunho

▪ grunho: 1.ª pessoa do singular do presente do indicativo de grunhir

grunho

nome masculino

1. porco

 2. calão, pejorativo indivíduo bronco

(De grunhir)


Na fala corrente e vulgar da região de Lisboa um Grunho pode ser definido como alguém que tem uma atitude pouco nobre, alguém desprovido de inteligência, de poucas maneiras, alguém com atitude bestial, criatura sub ou semi-humana, alguém pouco digno de ser quem é. E são principalmente estas ultimas palavras aquelas que são mais interessantes neste meu diagnóstico de A terra dos Grunhos, ou seja atitude ou condição sub ou semi-humana, alguém que não atingiu o seu pleno estado potencial. Condição essa que podemos observar na grande e esmagadora maioria dos seres humanos independentemente da raça, género ou condição financeira ou social!

Neste capítulo de - Os Grunhos Corporativos ­– daremos especial atenção a este sub-género de seres humanos aqui apelidados de Corporativos. Uma vez mais convém também definir o que é um ‘’Corporativo’’.

No mesmo dicionário acima descrito define-se assim:

corporativo

adjetivo

organizado ou baseado em corporações

(Do latim corporatīvu-, «fortificante», pelo francês corporatif, «corporativo»)



Um Corporativo é pois alguém que pertence a uma organização de pessoas com um interesse e objetivo comum, uma corporação. Entidade muitas vezes vaga nos seus métodos mas cujo objetivo é fazer lucro.

Mas basta de definições gerais e vamos ao que interessa!


O Grunho Corporativo

O Grunho corporativo julga-se parte de uma elite de gente que nasceu para reinar sobre os outros e fazer dinheiro com isso, tem como características comuns os seguintes atributos:

Ambicioso;

Despótico;

Manipulador;

Obstinado;

Dominante;

Seguro de si;

Forte;

Invasivo;

Não olha a meios para alcançar fins;

Superficial;

Iludido;

Tem sempre razão;

Raramente tem duvidas e nunca se engana;

Materialista;

Limitado e limitante;

Quadrado;

Cuida da aparência  dentro dos padrões estabelecidos;

Quer-se um vencedor;

Competitivo;

Só colabora hierarquicamente sendo dominante ou dominado;

Socialmente autista;

Profundamente desenraizado da sua natureza humana e espiritual;

Asséptico;

Anti-natural;

Robótico;

Escravo e escravizante!

 O Grunho Corporativo é um ultra especialista no que faz e pouco mais o interessa verdadeiramente a não ser que de alguma forma contribua para o seu mundo ideal, não tendo ideia de como é profundamente escravo da sua atitude e dos poderes ocultos que o dominam que estão baseados no poder, no estatuto, na sensação da falta material, na necessidade de adquirir, de ter mais, mais, mais... dai a necessidade de lucro sempre crescente.

Não tem perceção da falta de criatividade  para a vida que o define e de como é tão pobre e superficial que não consegue ter uma ideia melhor para a vida que não seja trabalhar para outrem uma vida inteira, ou criar a sua própria corporação sustentando-se na ilusão do que necessita materialmente e egoisticamente. É assim dominado pela necessidade de ter dinheiro não tanto para adquirir bens materiais mas pelo status e pela sensação de poder que ele traz. O Grunho Corporativo é assim dominado uma vida inteira pela ideia de como é forte, poderoso e melhor do que a maioria, revelando dois aspetos básicos da sua personalidade: a competitividade, como instrumento de superação, de distinção em relação aos outros e a necessidade de poder, de estatuto. A necessidade de dominar como prova da sua superioridade. Revelando assim a sua alma distorcida onde o ego determina a ação da sua vivência.

Os Grunhos corporativos distinguem-se em diferentes classes:

- O Capitalista: é a elite deste tipo de grunhos, o poderoso detentor de extraordinárias somas de capital, é ele que dita as regras do mercado, o oligarca absolutista que gere nas sombras os seus interesses manipulando a sociedade a seu bel prazer através das suas redes mafiosas de poder. São literalmente os donos do mundo dominando a banca, as corporações, a política, a propriedade física imóvel e as fontes de extrato e produção mundiais.

Este tipo de Grunho move-se essencialmente pelo poder que tem, o dinheiro em si já nem e importante, é o jogo de poder, domínio e manipulação que o satisfaz.

- A Elite visível: este e o tipo de Grunho visível para a maioria da população, são erradamente chamados de elite porque estão visíveis. São os políticos e os gestores das grandes corporações. São os que aparecem na TV, os braços direitos da verdadeira elite reinante. A estes também o jogo de poder os satisfaz mas tem um prazo de validade mais curto, pois ao estarem expostos à critica e aos olhos da maioria pelo que fazem acabam por não ter uma existência muito longa no seu poleiro. Mas, servem através da sua rotatividade pelo tempo possível os interesses maiores e acabam por ter uma vida recatada depois da excitação das luzes da ribalta. No fundo são os atores numa peca encenada por outrem.

- O quadro superior: a este grupo pertencem todos aqueles que são chamados diretores quer sejam superiores, médios ou juniores, os chefes, quer seja na banca, nas empresas, no estado ou no aparelho político. São quem faz realizar as ordens vindas de cima, os que tem contacto com os sectores de produção, mero instrumento das verdadeiras elites, são os ambiciosos que vieram do povo mas querem algum poder, os capatazes. São aqueles que trabalham nas empresas correndo o tempo inteiro para atingir os objetivos para poderem receber um salário maior do que a maioria e para ter os bónus extra como um carro novo de tempos a tempos e as felicitações do concelho de administração. Não têm verdadeiramente ideia de como são escravizados e de quão pouco recebem comparativamente com os ganhos das elites, são as máquinas ao serviço do poder sem imaginação para ter uma vida em liberdade. Vivem no medo de perder o seu "estatutozinho" que lhes traz regalias materiais que os apaziguam, são os bem comportados, são aqueles que a sociedade de hoje define como o exemplo de cidadão, de aparência limpa e conservadora, são os que quiseram enquadrar-se, enjaular-se num escritório, numa vida de rotinas, sóbria de esforço e dedicação a algo maior que ninguém sabe bem o que é, o sacrifício em prol do lucro crescente. São no fundo o óleo da máquina de produzir dinheiro.

 Os Grunhos Corporativos são assim tristes almas mirradas que não conseguem desenvolver as asas do Amor pleno, da liberdade e da consciência total, quedam-se pelas coisas pequeninas e mundanas que tanto os atormentam internamente, o poder, o estatuto e o material. São manipuladores e manipulados... tristes, doentes, desprovidos de Humanidade no sentido profundo que esta palavra tem.

Infelizmente o mundo em que vivemos hoje é um mundo de corporativos, máfia institucionalizada mundialmente e que partilha o poder entre corporações propriamente ditas, o Estado como mera extensão dos interesses corporativos, o poder judicial como ramo abonatório dos poderes anteriores, o sistema bancário como o cerne de todo o sistema e o ramo propagandista a que se chama de órgãos de informação ou média. Todos eles colaboram intrinsecamente para proteger e manter os seus interesses internos em detrimento da ética, da justiça, da paz, da sabedoria e do bem estar geral da população.

O mundo funciona hoje como uma mera corporação gerida pelos Grunhos Corporativos!

P.S. Como em todas as definições este resumo peca por limitado pois o grau de complexidade do nosso mundo e muito maior. Uma especial ressalva merecem também todas as pessoas e são muitas que trabalhando em corporações ou sendo proprietários de empresas são almas maiores, gente boa que merecem ser o exemplo!

As corporações, o capitalismo ou o dinheiro não são entidades intrinsecamente mas, o que as faz negativas e o nível de pessoas perturbadas, castradas ou passivas que permitem que cada uma seja infetada por uma mentalidade corrosiva.


Cabe a cada um de nos elevar o nível de consciência e de ação e alterar a sociedade!

* João Ferro é mais um dos emigrantes portugueses na Polónia. O texto é totalmente da sua autoria. 

domingo, 2 de setembro de 2012

Julia Butterfly Hill - 738 dias no alto de uma sequoia

Diz que tinha 6 anos e fazia uma caminhada com os seus pais quando uma borboleta pousou num dos dedos da sua mão ficando com ela por algum tempo, o suficiente para que, a partir de então, a passassem a chamar butterfly (borboleta). Os Hill são daquelas famílias que por vezes vemos no cinema. Viviam numa grande auto-caravana e o seu pai pregava o evangelho de cidade em cidade. Foi neste ambiente que cresceu Julia uma activista americana que ficou conhecida pela sua determinação em salvar uma sequoia com 1000 anos das serras dos madeireiros da Califórnia.

Capa do livro O Legado de Luna (The Legacy of Luna)

Esta história ainda não passou para o grande ecrã apesar de algumas tentativas e intenções de algumas figuras em Hollywood. Dizem que em tempos de crise a história de uma heroína e activista pro-ambiental não vende. Foi adiado e esperam que algum mecenas possa disponibilizar os fundos necessários para o filme sobre Julia e a sequoia gigante que foi baptizada de Luna. 

Tudo começou na realidade com um grave acidente de viação em Agosto de 1996 tinha Julia 22 anos. Sendo a única pessoa sóbria num grupo de amigos Julia conduzia tranquilamente quando um condutor alcoolizado embateu violentamente na traseira do veiculo. O volante partiu com o impacto da sua cabeça e perfurou-lhe o crânio. Foi só após um ano de recuperação e terapia que voltou a poder falar, caminhar e expressar-se naturalmente. 

Este acontecimento foi o catalisador para a maior mudança da sua vida. Diz em entrevista que: 

"Enquanto recuperava, percebi que toda a minha vida tinha estado fora de equilíbrio. Finalizei o ensino secundário aos 16 anos estando a trabalhando sem parar desde então, primeiro como empregada de mesa, depois como gerente de restaurante. Estava obcecada pela minha carreira, sucesso e coisas materiais. O acidente despertou-me para a importância do momento fazendo o que podia para ter um impacto positivo no futuro. (...) O volante na minha cabeça foi, figurativa e literalmente, o que me conduziu numa nova direcção da minha vida".

Foi então que Julia encetou uma road trip para a Califórnia interessando-se por um grupo pro-ambientalista ligado à musica reggae. Protestavam contra o crime ambiental dos madeireiros californianos e do gigante das madeiras a Pacific Lumber Co. propriedade de um magnata texano. Os protestos entre estes e os ambientalista haviam subido de tom e culminado com armas de fogo e uma tragédia onde a vida de um jovem de 20 anos foi interrompida. A descoberta de Luna foi por acaso e deu-se quando alguém notou a marca a tinta azul que significava "árvore para abate". O grupo montou prontamente uma pequena plataforma de 1.80x1.80 metros na árvore, a cerca de 55 metros de altura (o equivalente a um décimo quarto andar) e foi rodando entre si. Cada um ficava um ou dois dias mas a ideia era um voluntário que ficasse pelo menos uma semana para que o impacto nos media fosse mais visível. Julia subiu a sequoia e em vez de uma semana ficou dois anos seguidos.

Este braço de ferro entre a Pacific Lumber Co., os madeireiros e os ambientalistas foi um record. Julia viveu embrulhada em sacos-cama durante a invernia tendo apenas uma tenda que praticamente cobria a precária plataforma. A sua determinação chamou gradualmente a atenção para a necessidade de proteger as florestas antigas que outrora abundavam na América mas que pela ganância das grandes corporações e dos lobbies das madeiras foram sendo dizimadas. Durante esses dois anos a árvore foi sacudida por ventos fortíssimos do El Nino, por as pás dos helicópteros da Pacific Lumber Co. e Julia teve madeireiros a ameaçarem a sua integridade física e o corte de Luna caso ela não descesse. Durante dez dias uma empresa de segurança a mando dos madeireiros isolou Julia impedindo que lhe fizessem chegar provisões. Num documentário sobre a história de Julia (Adventures on Treesitting) a heroína refere as condições duras durante o Inverno com chuva gelada, vento e o isolamento ao estar confinada a um quadrado com menos de 2 metros. Um pequeno camping-gaz e um telemóvel a bateria solar foram dos poucos confortos que Julia levou para a gigantesca sequoia. 

 Vídeo com Julia Hill a descer Luna em Dezembro de 1999

Em 1999 sendo já visível no rosto e no corpo de Julia as consequências da sua longa jornada no topo da sequoia a Pacific Lumber Co. decidiu chegar a um acordo. Uma área-tampão (buffer zone) de cerca de 200 pés (60 metros) foi aceite a troco de 50.000 dólares angariados por diversas associações ambientalistas. O dinheiro foi posteriormente revertido para o estudo de florestas sustentáveis. Julia desceu Luna e não evitou o choro ao separar-se da sua milenar companheira de dois anos. Dizia não entender o que passa pela cabeça de alguém para cortar uma árvore como aquela. Nascia uma das maiores activistas para a protecção das florestas. 
Luna, ficando isolada em terreno da Pacific Lumber Co., sofreu pouco depois um ataque. Em 2000 descobriram um profundo corte no seu tronco. Um puro acto de vandalismo que, felizmente, foi curado com aplicação de ervas na "ferida" aberta por gente sem escrúpulos e brutalizada. Cabos de aço e um colar em volta do tronco previnem que os ventos fortes derrubem Luna. A árvore recuperou e apesar de nunca se ter encontrado o culpados(s) este acontecimento marca o fim de uma luta de 15 anos para se preservar a floresta de Headwaters, agora um parque nacional que atrai milhares de turistas e que constitui apenas 3% do ecossistema original! [1]

Julia Butterfly Hill continua a sua luta. Foi presa e deportada do Equador quando tentava proteger uma floresta milenar da depredação causada pela construção de um pipeline e é uma das vozes activas contra o sistema de taxação fiscal dos EUA conhecido como IRS. A sua história foi inspiração para musicas, livros, documentários e sobretudo para outros ambientalistas.

Podem ler mais sobre Julia no seu site ofical: Julia Butterfly Hill

[1] http://www.circleoflife.org/inspiration/luna/

Fontes: Wikipédia e site da autora.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Mais uma vez a Maçonaria, Portugal e Salazar




Surgiu numa página do Ministério da Justiça, Instituto das Tecnologias da Informação na Justiça (Bases Jurídico-Documentais) o seguinte acórdão datado de 14/01/2010, que se encontra aqui.



Alguns excertos do referido acórdão:

1ª O Supremo Tribunal Administrativo é uma loja maçónica criada, instalada, dirigida e presidida por maçons - como, aliás, o Supremo Tribunal de Justiça é uma loja maçónica, criada e instalada por maçons, em aplicação do disposto no Ritual do Grau 27, e sendo o seu primeiro presidente — B… — e seguintes igualmente maçons.
2ª E sabe-se como ensina o maçon C… — ex-Grão Mestre do Grande Oriente Lusitano, Soberano Grande Inspector Geral e presidente do Supremo Tribunal Maçónico — «onde está um Maçon está a Maçonaria» (António Arnaut, Introdução à Maçonaria, Coimbra Editora, p. 86).


6 ª Aliás, em virtude dos benefícios que resultam de se saber que o Supremo Tribunal Administrativo é uma loja maçónica, só por mero lapso ou falta de tempo se compreende que isso não seja amplamente divulgado e que os maçons do Supremo Tribunal Administrativo e outros não tenham dado a conhecer essa sua excelente qualidade, nem sequer às respectivas mulheres e família — sendo por isso que, para suprir a lacuna, o recorrente divulgará brevemente as listas dos juízes maçons, em benefício do povo, do Supremo Tribunal Administrativo, da Maçonaria e dos maçons, através da Internet e outros meios, e incluirá também os magistrados do Ministério Público e Procuradores-Gerais da República, como D…, e arguidos, como E…, F…, G…, H…, etc.
7ª Naturalmente, também não serão esquecidos os apresentadores de televisão e os homens do teatro, como I… e J...

10ª Além disso, enquanto loja maçónica que é, o Supremo Tribunal Administrativo sempre tem procurado seguir o ensino do grande maçon António de Oliveira Salazar, a saber: «criminosos arvoraram-se em juízes e condenaram pessoas de bem» (Discursos, vol. V, p. 52); «o que muitas vezes resulta em Portugal do funcionamento das instituições legais — o castigo dos justos» (vol. II, p. 357); «se os tribunais não fazem boa averiguação dos factos e recta aplicação da lei, temos (…) “a mentira da justiça” (vol. 1, p. 28); «os povos, como os indivíduos precisam ser tratados com justiça» (111:108); e «a sociedade tem de inspirar-se nas suas decisões pelo princípio da justiça devida a cada um (vol. IV, p. 108).


16ª Nenhum dos subscritores da prancha arguida de inexistente tem o direito de pertencer à Máfia que opera nos tribunais portugueses e menos de jurar fazer da lei dessa Máfia «a minha regra e a minha lei».
17ª Estes elementos da Máfia que actua nos tribunais portugueses, incluindo o relator, não são, pois, verdadeiros juízes.



Ora isto vai de acordo com um polémico livro do magistrado Costa Pimenta que recentemente se encontrava à venda na Bertrand e que já vai em segunda edição.
Segundo Costa Pimenta, António de Oliveira Salazar, foi iniciado maçon em 1914 na Loja Revolta n.º 336. Declara o autor que esta loja maçónica nunca "abateu pilares" (nunca foi encerrada) durante o Estado-Novo.

Citando o autor em entrevista (ver aqui)


Há provas circunstanciais, mas não decisivas, do seguinte: Salazar foi iniciado maçon na Loja Revolta n.º 336, em Coimbra, em 1914, no fim do seu curso de Direito, tendo adoptado o nome simbólico de Pombal. A Loja Revolta, onde se iniciaria também, por exemplo, Vitorino Nemésio, fora fundada por Bissaya Barreto, em 1909, e foi a convite dele que Salazar lá foi iniciado. Sem qualquer surpresa, a Loja maçónica Revolta jamais "abateu colunas" (nunca fechou), tendo continuado a sua actividade, serena e ininterruptamente, sem inquietação alguma, durante todo o período da Ditadura e do Estado Novo até hoje. Não parece que Salazar tenha sido iniciado na loja maçónica, composta por professores da Faculdade de Direito de Coimbra e que, desde 1850, governa aquela instituição.



Ficam as perguntas no ar. Qual o propósito do acórdão? Como poderia ser Salazar maçon se durante o Estado-Novo se extinguiram a maior parte das lojas maçónicas portuguesas? Qual o real poder da Maçonaria na Republica Portuguesa?

Será o ex-dirigente do PS Henrique Neto um antimaçónico quando em entrevista no programa televisivo Plano Inclinado referiu a necessidade de extirpar os maçons da república portuguesa e do PS?

 

sábado, 16 de junho de 2012

Qual a verdadeira bandeira?

Era uma vez um belo país na Europa do Sul, banhado pelo Atlântico. Nesse país morava um Rei, uma Rainha e dois Príncipes. Um dia dois destemidos homens esperaram que o coche real passasse em determinado local e dispararam uma saraivada de tiros. O Rei e o Príncipe herdeiro morreram ali mesmo e o reino de Portugal passou a república portuguesa dois anos depois. E assim todos viveram felizes para sempre...

A ultima bandeira de Portugal antes da alteração dos símbolos nacionais

Esta é a história que, mais ou menos, aprendemos na escola. A implantação da república foi fruto de um golpe de estado em 1910. Na realidade pouco se menciona sobre o regicídio no ano de 1908 e o modo como o Rei D. Carlos e o Príncipe Luís Filipe foram chacinados por Alfredo Costa e Manuel Buiça. A Rainha, D. Amélia de Orleães viu portanto o seu marido e filho mais velho sucumbirem enquanto o mais novo, D. Manuel II, pouco mais pode fazer do que tentar estancar, em vão, a ferida mortal do seu irmão que havia recebido um tiro no rosto. Pouco se fala sobre o que aconteceu à família real depois do fim da monarquia nem tampouco como Maria Pia de Saboia - mãe de D. Carlos - viveu o resto dos seus dias em tormento com a tragédia de 1908. Viveram no exílio enquanto a república se construia.

Esta história é paralela a outra que não se menciona sequer nos livros de História. Alias não se menciona praticamente nada sobre a Maçonaria em livros de História nas escolas. Quem na escola primária e secundária ouviu falar de maçons? De sociedades secretas? Ninguém. 
Talvez por isso mereçam a anedota do Joãozinho que com um amigo tentavam espiar um ritual maçónico. Joãozinho trepou um muro e o amigo perguntava - E então o que vês? Olha só... O gajo está com uma venda nos olhos e com as calças arregaçadas numa perna. Um gordo está a apontar-lhe uma espada ao pescoço! - Eh! A sério? Diz o amigo. Nisto o Joãozinho desequilibra-se, cai para dentro do muro e o amigo foge. Horas depois encontra Joãozinho muito bem vestido e com uma cara muito grave. - E então, conta, conta, o que viste? Responde o Joãozinho. - Não posso, é segredo.

A verdade é que essa Ordem Iniciática (como eles se intitulam) que não é secreta mas tem segredos (como disse um maçon qualquer) teve e tem intervenção em inúmeros acontecimentos na História mundial. Alegadamente descendentes dos Templários depois da purga encetada por Filipe o Belo de França e do assassinato do seu Grão-mestre Jacques de Molay - numa Sexta-Feira 13 - vão para a clandestinidade emergindo na Escócia onde fundam um dos ritos da Maçonaria moderna. Portugal não foi excepção e a sua influência na História de Portugal está sempre presente. Nas duas ultimas décadas do século XIX sucederam-se atentados e tentativas frustradas de Golpe de Estado onde uma associação secreta denominada de Carbonária teve papel preponderante. Tida por uns como braço armado da Maçonaria (Grande Oriente de Portugal) e por outros como uma associação de rebeldes revolucionários, pouco instruídos nalguns casos, e com pouca ou mesmo nenhuma ligação aos maçons. 

Bandeira da Carbonária: Imagem picada do blogue: http://classepolitica.blogspot.de/2010/10/bandeira-da-carbonaria-braco-armado-da.html

 Buiça e Costa ainda tidos por alguns republicanos de ala dura como heróis são venerados e mesmo merecedores de romagens ao cemitério por alturas do 10 de Junho. Curiosamente a bandeira usada pelos carbonarios tem grandes semelhanças com a bandeira actual que substituiu, sem consulta pública, a bandeira histórica e antiga com as cores azul e branca.

Manuel de Arriaga o primeiro presidente da república portuguesa era maçon tal como a maior parte dos presidentes da república portugueses.
D. Duarte Nuno, o Rei de Portugal, que não é verdadeiramente Rei mas podia ser aborda amiúde a questão das cores da bandeira que, na opinião de alguns monárquicos, simboliza não só o vermelho do sangue derramado e o verde da esperança mas sim o projecto de uma união ibérica na qual porventura serão os maçons portugueses e espanhóis a governarem a península ibérica. 

“há muita gente com influência em Portugal que, desde 1910, apostou na extinção de Portugal como país (...) Este foi um dos grandes projectos dos revolucionários do 05 de Outubro. E a bandeira verde e vermelha representa precisamente essa união ibérica que julga que ao arruinar Portugal está a provar que o país não é viável”,

O ideal de um mundo igualitário onde as fronteiras, o sentido de pertença não a uma nação mas a um todo, onde não haja um poder local mas sim central tem vindo a ser construido desde o final da II Grande Guerra. Da Comunidade do Carvão e do Aço à CEE, passando a UE, o projecto de uma união entre o Canadá, EUA e México, União Africana e também a criação do Estado de Israel são terreno fértil para teorias da conspiração que nos falam de lobbies judaicos de cariz sionista que controlam desde tempos imemoriais as economias das nações livres. 


Adolph Hitler em 1940 aborda a influência da Maçonaria num dos seus discursos inflamados.

Terá a Maçonaria uma agenda a cumprir? Portugal é um país governado por maçons? A questão fica no ar e por uma questão de tranquilidade podemos varrer para debaixo do tapete das teorias da conspiração.

domingo, 18 de março de 2012

Sou de Vila de Nova de Famalicão

Quando me perguntam de onde sou respondo automaticamente - sou de Famalicão. Não o Famalicão lá para os lados da Serra da Estrela mas sim aquele no verde Minho, o puro e duro Vila Nova de Famalicão, entre o Porto e Braga, a dois passos de Barcelos e Guimarães, de onde se vê o Oceano Atlântico para quem se aventura a subir o topo do Monte do Facho (Santa Catarina). Na pronúncia típica das suas gentes soa a Famalicon. Terra do vinho verde, das videiras, das fabricas têxteis e do crescimento inusitado de uma pequena vila de província para uma cidade grande mas não tanto ao ponto de encontrarmos nas ruas alguém conhecido sempre que percorremos as suas ruas.



Não nasci em Vila Nova de Famalicão, nasci em Lisboa mas podia ter nascido em Luanda ou até em Bragança, foi uma questão de "timming". No entanto passei 26 anos da minha vida nessa cidade minhota. Os anos mais importantes talvez. Cheguei a Famalicão no final dos anos setenta, numa noite húmida em contraste com o tempo mais agradável que se sentia junto à costa do Estoril. Pouco sabia do Norte de Portugal e só o spot publicitário ao licor Aldeia Velha (é cá dos nossos, é cá dos nossos, Aldeia Velha para os nossos copos!) me dava uma pequena ideia do que poderia vir a ser viver na província. 



O centro de Famalicão em 1978 resumia-se à Rua Adriano Pinto Basto, ao campo da feira, a Praça D. Maria II e a Avenida 25 de Abril sendo a estação de serviço Íris o ex-libris da gastronomia famalicense. Um Cine-Teatro chamado Augusto Correia (infelizmente demolido nos anos noventa), um hotel, o intrigante edifício da Fundação Cupertino de Miranda e o edifício da Câmara Municipal (o original ficou destruído num incêndio). 

Havia depois a enorme fábrica dos relógios A Boa Reguladora, ali a dois passos da estação de caminhos-de-ferro e da minha casa e a gigantesca fábrica de têxteis Manuel Gonçalves cujos escritórios estavam então na rua Adriano Pinto Basto. Em frente ficava a mercearia do Senhor Zé e da Dona Luísa e dali regalava-me a ver os automóveis que estacionavam, principalmente quando tinham matriculas alemãs. Um Audi Quattro era uma visão inusitada numa pequena vila de província. Havia também o lambe-botas dos escritórios de Manuel Gonçalves. Uma criatura patética, pálida e servil ao ponto de colocar as mãos em concha para ajudar a sair do Mercedes S o velho industrial. Nada que um pontapé nas mãos não resolvesse para gáudio de muitos que assistiam do outro lado da rua, inclusivamente o barbeiro daqueles à antiga e que gostava de um copo de verde...

As ruas eram maioritariamente em paralelo e onde hoje em dia se encontra o edifício Dallas era o fim da vila e o começo da EN para o Porto. A esquadra da PSP ficava entre a Rua Direita e a Av. 25 de Abril. Um fumarento Peugeot 404 (chamavam-lhes os Nivea) perseguia os meliantes - quando os havia - mas tinha dificuldades em perseguir as Famel, Casal Boss e restante motorizadas que ruidosamente atravessavam a vila. Para lá da Íris ficava a EN para Guimarães. 

Ganhou-se muito e perdeu-se bastante. O Ave outrora um cristalino rio onde os minhotos se banhavam e bebiam ficou praticamente irreparável, muitas tradições desapareceram com os avós e bisavós. O Minho continua a ser verde, lá estão as videiras e os campos mas numa quantidade muito menor e nas florestas impera o eucalipto, fruto de um Portugal que não olhou a meios para atingir determinados fins.

Isto tudo a propósito de um vídeo partilhado no Facebook pela minha amiga Inês. Chama-se Famalicão e foi rodado em 1940 pelo nosso centenário cineasta Manoel de Oliveira. Vale a pena ver! Especialmente para quem conhece a terra e as suas gentes.


Muito há para contar sobre Famalicão. 26 anos são muitos episódios. Um dia tenho de contar aquela estória de um Carnaval em que um certo grupo que se vestiu de peixeiras e estampou-se num Fiat 124 lá para os lados de Vilarinho das Cambas, ou aquele do sinistro tipo da morgue que apareceu de catana e queria cortar as cabeças a quem estava na esplanada do café Camões, e o brasileiro que jurava a pés juntos que dava 140 km/h em primeira num Renault 5? E o...